Como manejar a utilização de fluidos na sepse?

A terapia com fluidos é uma das intervenções mais tradicionais da medicina. O maior problema reside no fato de não entendermos a dimensão do uso dos fluidos. Por vezes, tratamos os fluidos como algo inócuo ou com poucos efeitos adversos.

Fluidos devem ser entendidos como qualquer outra droga intravenosa, com suas devidas indicações, efeitos adversos, custos e doses… A sobrecarga volêmica leva a disfunção orgânica associada, assim como hipercloremia pode levar à acidose, por exemplo.

A ressuscitação volêmica na sepse é um dos pilares do Pacote de Medidas da Primeira Hora de atendimento. Vamos então usar esse perfil de paciente para abordar alguns aspectos importantes da utilização de fluidos, assim como as principais perguntas e respostas sobre o tópico.

Administração e remoção de fluidos em pacientes graves com sepse: 4 fases

1.  Ressuscitação: administre fluidos para reverter a hipoperfusão!

●     Estabeleça o diagnóstico de sepse e hipoperfusão;

●     Administre o bolus inicial de fluidos;

●     Administre vasopressores, se necessário (por exemplo, norepinefrina, vasopressina).

●     Avalie a responsividade aos fluidos e trate a infecção.

2.  Otimização – Estabeleça a perfusão para órgãos e tecidos:

●     Considere riscos e benefícios da administração adicional de fluidos com base na responsividade aos fluidos e nos sinais de hipoperfusão;

●     Titule vasopressores e inotrópicos para metas hemodinâmicas específicas (por exemplo, lactato, tempo de enchimento capilar).

3.  Estabilização – Mantenha a perfusão:

●     Monitore a sobrecarga de fluidos e disfunção de órgãos associada.

●     Avalie e trate qualquer disfunção de órgãos.

●     Considere uma abordagem restritiva que limite a administração adicional de fluidos.

●     Monitore o tempo de enchimento capilar, lactato e outros marcadores de perfusão.

4.  Evacuação – Facilite a recuperação e a remoção do excesso de fluidos

●     Considere a remoção do excesso de fluidos acumulado durante a fase de doença grave por meio de diurese ou terapia de substituição renal, se indicado;

●     Inicie planos precoces de reabilitação, mobilização e nutrição.

Essas 4 clássicas fases do manejo de fluidos na sepse, podem ser agrupadas no mnemônico ROSE – Resuscitation, Optimization, Stabilization e Evacuation.

Entendemos que o paciente pode caminhar pelas fases, não sendo uma lógica linear. Ele pode transitar entre as mesmas, conforme status clínico do momento. No entanto, não podemos esquecer que ter uma abordagem estruturada é mais benéfico que simplesmente sair por aí administrando fluidos.

Agora, vamos ver algumas das principais dúvidas relacionadas aos fluidos na sepse.

Quando devemos iniciar a terapia com fluidos na sepse?

Deve ser iniciada para pacientes com evidência de hipoperfusão induzida pela sepse (alteração do estado mental, hipotensão arterial, redução da diurese, tempo anormal de enchimento capilar) que provavelmente terão aumento do débito cardíaco com a administração de fluidos.

A administração de fluidos deve ser interrompida quando a evidência de hipoperfusão desaparecer, o paciente não responder mais aos fluidos ou o paciente apresentar evidências de sobrecarga de fluidos.

Qual tipo de fluido deve ser usado?

Soluções balanceadas (por exemplo, Ringer lactato, Plasma-Lyte) devem ser selecionadas em vez de solução salina a 0,9% nos pacientes sépticos. Amidos não devem ser usados em pacientes com sepse.

Quando considerar a remoção de fluidos e como deve ser feita?

A remoção de fluidos deve ser considerada após as fases de ressuscitação e otimização e quando um paciente estiver estabilizado (por exemplo, diminuição das doses de vasopressores, perfusão periférica adequada). Os diuréticos são a terapia de primeira linha para facilitar a eliminação de fluidos.

A terapia de substituição renal pode ser considerada para pacientes com lesão renal aguda grave que tenham complicações devido à sobrecarga de fluidos e não respondam à terapia com diuréticos.

Em resumo…

●     Fluidos devem ser administrados com o mesmo cuidado que qualquer outra droga intravenosa;

●     Em geral, soluções balanceadas são mais interessantes pela sua composição (Ringer Lactato mais barato que Plasmalyte). Vão bem na ressuscitação inicial da maioria dos pacientes graves!

●     Fluidorresponsividade não significa que o paciente necessita ressuscitação volêmica!

●     Não deixe o paciente iniciar sobrecarga hídrica para cessar a ressuscitação volêmica. Otimize a terapia!

●     Considere o uso precoce de droga vasoativa para limitar a sobrecarga volêmica e otimização da perfusão de forma mais rápida.

Referências:

1.    Zampieri FG, Bagshaw SM, Semler MW. Fluid Therapy for Critically Ill Adults With Sepsis: A Review. JAMA. 2023;329(22):1967-1980. doi:10.1001/jama.2023.7560

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