Vacina contra o vírus sincicial respiratório (VSR): quem deve receber?

Em lactentes, uma das infecções respiratórias mais comuns é a bronquiolite viral aguda. A transmissão ocorre por contato direto (mãos e objetos) ou pelo ar (secreções) e a fonte da infecção é, em geral, alguém da própria família ou da sala de aula (na creche ou escola).

A maioria dos casos de bronquiolite em criança são autolimitados e tratados apenas com sintomáticos. Mas, alguns pacientes têm maior risco de apresentar complicações graves com necessidade de internação e suporte ventilatório, principalmente no primeiro ano de vida e quando há doenças associadas — a exemplo da doença pulmonar crônica da prematuridade.

A imunização passiva com o palivizumabe (um anticorpo monoclonal) é recomendada para determinados grupos de maior vulnerabilidade na sazonalidade.

Dúvida Clínica:

É possível diminuir em neonatos e lactentes as doenças respiratórias associadas ao VSR a partir da vacinação durante a gestação?

Em abril de 2023 foi publicado o ensaio clínico Bivalent Prefusion F Vaccine in Pregnancy to Prevent RSV Illness in Infants. Vamos analisar os principais tópicos desse estudo:

Sobre o Estudo

Estudo randomizado, duplo-cego e controlado por placebo, de fase 3 e realizado em 18 países.

Pacientes

Foram incluídas mais de sete mil gestantes, até 49 anos, com 24 a 36 semanas de gestação e distribuídas aleatoriamente na proporção 1:1.   

Como foi realizada a intervenção?

Administração em dose única e pela via intramuscular (120 μg) de uma pré-fusão bivalente de VSR (vacina à base de proteína F – RSVpreF) ou placebo. 

Qual desfecho pesquisado?

Os desfechos primários de eficácia da RSVpreF foram: doença grave do trato respiratório associada ao VSR com atendimento médico; e doença do trato respiratório inferior associada ao VSR com atendimento médico em lactentes dentro de 90, 120, 150 e 180 dias após o nascimento. 

Resultados

Foram 3.682 participantes que receberam a RSVpreF (3570 avaliadas) e 3.676 participantes receberam placebo (3.558 avaliadas). A maioria (44,7%) das mulheres estavam entre 32 e 36 semanas de gestação.

Foi coletado sangue do cordão umbilical a partir do nascimento e na presença de sintomas respiratórios na criança, como coriza, tosse e apneia, era feito RT PCR para pesquisa do VSR.

A doença grave do trato respiratório inferior ocorreu dentro de 90 dias após o nascimento em 6 lactentes de mulheres no grupo da vacina; e em 33 crianças de mulheres no grupo do placebo (eficácia da vacina, 81,8%; IC 99,5%, 40,6 a 96,3). Sendo que, 19 e 62 casos, respectivamente, ocorreram dentro de 180 dias após o nascimento (eficácia da vacina, 69,4%; IC 97,58%, 44,3 a 84,1).

Doença do trato respiratório inferior associada ao VSR com atendimento médico ocorreu dentro de 90 dias após o nascimento, em 24 lactentes de mulheres no grupo da vacina; e 56 mulheres no grupo do placebo (eficácia da vacina, 57,1%; IC 99,5%, 14,7 a 79,8).

As incidências de eventos adversos relatados dentro de 1 mês após a aplicação ou dentro de 1 mês após o nascimento foram idênticas no grupo da vacina (13,8% das mulheres e 37,1% das crianças) e no grupo do placebo (13,1% e 34,5%, respectivamente).

Nas gestantes que receberam a vacina acima de 28 semanas de gestação a eficácia foi melhor, chegou a 90% nos primeiros 90 dias de vida e entre 76 e 88% nos 180 dias.    Nenhuma preocupação de segurança foi identificada nas gestantes ou nas crianças que foram acompanhadas até 2 anos, e não houve influência no aumento do risco de óbito fetal ou de parto prematuro.

Pontos de Atenção

Trata-se de trial multicêntrico bem conduzido por pesquisadores vinculados ao laboratório Pfizer, que desenvolveram a RSVpreF para gestantes com a finalidade de levar a produção de anticorpos (IgG) e consequente proteção da criança nos primeiros seis meses de vida.

Todavia, em pesquisa com vacina semelhante, produzida por outro laboratório, houve um possível risco relacionado ao parto prematuro nas gestantes vacinadas. Dessa forma, o surgimento de eventos adversos deve ser cautelosamente monitorado após a comercialização dessa e outras vacinas contra o VSR.

Como o estudo muda minha prática?

O calendário vacinal recomendado para gestantes e o indicado para crianças continuam sem a inclusão de uma vacina contra o VSR. No entanto, em maio de 2023, as duas primeiras vacinas contra o VSR foram aprovadas nos EUA e na Europa para indivíduos com 60 anos ou mais. Existe uma expectativa que, em breve, sejam também aprovadas as vacinas contra o VSR para administração em mulheres grávidas, a fim de proteger lactentes até 6 meses. No Brasil, a empresa Pfizer já protocolou, em agosto de 2023, o pedido de registro da vacina contra o VSR e está aguardando a análise pela Anvisa.

Referências:

Bivalent Prefusion F Vaccine in Pregnancy to Prevent RSV Illness in Infants

Kampmann B et al. Bivalent Prefusion F Vaccine in Pregnancy to Prevent RSV Illness in Infants. N Engl J Med 2023 Apr 20;388(16):1451-1464. doi: 10.1056/NEJMoa2216480.

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